ReviviscereFoi com minha avó paterna que aprendi a rezar , por volta dos cinco anos de idade .
Ganhei dela o livrinho de catecismo que fora de meu pai . Lendo juntas , em voz alta , antes de dormir , logo eu sabia de cor duas das principais orações católicas . Posso dizer que o
Pai-Nosso e a
Ave-Maria foram minhas primeiras leituras regulares .
Através de meus avós , católicos praticantes -- no sentido mais fiel da expressão -- , eu e minha
irmã cedo entendemos que a sexta-feira anterior à
Páscoa era ,
verdadeiramente , santa .
Portanto : nada de brigas, gritaria , algazarra com os cachorros , música alta . Explicaram-nos , naquele tom naturalmente eufemístico , próprio da fala dos avós , que tamanha deferência era um dos modos de que dispúnhamos para retribuir o que
Cristo enfrentara por nós . Naquele mesmo dia , muitos , muitos anos antes de virmos ao mundo .
Crianças demais , naquela altura , para interpor questões ( eu tinha cinco para seis anos , a
Cristina , três ) , acatáramos o explicado , comportando-nos conforme pedido . Mais por cumplicidade do que por respeito , é bom que se diga .
O fato é que aquelas "interdições" jamais se confundiram com reprimendas . Pelo contrário : mantiveram-se , algum tempo depois , como senhas para a
celebração de um entre os tantos
rituais mágicos que as crianças partilham com pais , irmãos mais velhos e , principalmente , com os seus avós .
Da adolescência até aqui, experimentei
alguns credos . Hoje, não professo nenhuma religião . Mas , aquele sentimento -- agora , mais respeitoso do que mágico -- ,
continua ressurgindo a cada sexta-feira que antecede a
Páscoa . E eu o deixo vir .
Adriana Paiva ( c ) 2003. . . . .
P.S .: (
Sirva-lhes o simbolismo contido no 'reditus ad vitam' como toque , poderoso mote . Boa Páscoa ! )
. . . . .
"
* 2 º Exercício de esperança ao ar livre "
(
Cassiano Ricardo )
Coisas que espero :Pra satisfazer o que há em mim de criança
- ver a mãe de ouro .
Pra resolver uma pendência poética , já antiga
- ouvir o sabiá cantar, mas na palmeira .
Pra convencer-me de minha humildade
- ser recebido pelo Papa .
Pra verificar se o governo cumpre o que promete
- fazer do "Diário Oficial " o meu poema .
Pra ter certeza de que os outros se consideram felizes
- sentir que já posso ser alegre sem remorso ;
sem que a alegria da véspera se transforme
em tristeza do dia seguinte .
Mas , o que mais espero -- e isto acima de todas as coisas --
é assistir ao sermão da Planície
em que Cristo dirá verdades que não disse
no da Montanha .
. . . . . .
* ( ' A
Infância e a Família' - pág. 34
. Em : "
A Flauta que me Roubaram - Coletânea Poética de Cassiano Ricardo" - Org.: Júlio Ottoboni . Ed.: Petrobras / 1999 ) .
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